Conclusões do 3º Colóquio sobre o Uso sustentável dos Pesticidas
Sem querer perder muito tempo, preciso de um minuto para agradecer à Associação Portuguesa de Horticultura, ao COTHN e à Escola Superior Agrária de Santarém, o convite e o desafio para ocupar este lugar de fala, e tentar em poucas palavras resumir a apresentar algumas das conclusões que resultaram desta jornada sobre o uso sustentável dos pesticidas.
Quisemos ouvir os agricultores e as suas associações sobre o presente.
Quisemos ouvir a ciência, o ensino, os políticos sobre o futuro.
Começamos por relembrar a
história destes momentos de encontro. Começamos a debater o uso sustentável dos
pesticidas em 2013, e desde então procuramos, em cada momento, juntar os
diferentes atores que são determinantes para a mudança que se pretende, desde
os agricultores aos consumidores. Desafiámo-nos a conversar sobre os caminhos
para uma atividade agrícola sustentável, com soluções viáveis, proteção da
saúde e garantia da conservação dos recursos naturais.
Como primeira conclusão, emerge do dia de hoje que a proteção das plantas é uma componente dos itinerários técnicos com grande relevância, não só pelas múltiplas combinações inimigo/cultura/região/sistema de produção, como pela crescente incerteza e mudança causada pelas alterações climáticas. Aos problemas clássicos e mais ou menos estudados, como o míldio ou bicho arroz da couve, juntam-se a uma velocidade crescente outros como a Tuta absoluta ou os vírus.
Para esta lista comprida de problemas, mantém-se algumas soluções clássicas, sejam culturais, como o recurso a variedades melhoradas, ou químicas como o uso do cobre, outras perderam o interesse, por razoes de ineficácia, custos ou dificuldade técnicas, e surgem novas soluções, como o uso de soluções de base biológica, como o óleo de laranja para aumentar a duração dos tratamentos, ou o uso de soluções tecnológicas, como o recurso a drones ou a equipamentos de aplicação variável em função da área foliar ou da localização do inimigo na parcela.
No entanto, parecem ser de igual ou maior dimensão a inexistência de respostas para tantas combinações possíveis. Em geral, todos apontaram a necessidade de trabalhar ou rever a estimativa do risco, desenvolver ou reaferir níveis de ataque, desenvolver, testar e validar novas soluções de proteção desde meios culturais, biológicos, biotécnicos, ou químicos, cada vez com melhor utilização da inteligência artificial ou sistemas de precisão.
Sem, no entanto, descorar que a melhor estratégia assenta, ainda, no IOT – ir ó terreno, termo que irá passar a constar nos livros de proteção das culturas.
Algumas limitações, e possíveis soluções, não podem ser desligadas do mercado que construímos e exigimos.
Por um lado, as limitações do mercado de fatores de produção, desde as restrições colocadas pela complexidade e morosidade dos processos de homologação de soluções químicas ou biológicas ou da utilização com base em usos menores, à dificuldade, inexistência ou custo de soluções como a confusão sexual, armadilhas automáticas, ou equipamentos dimensionados e adequados a cada realidade.
A necessidade de apoio técnico, seja pela presença de técnicos e suas associações, seja através dos serviços públicos, como os serviços de avisos ou de fiscalização, ou pela ação de entidades do ensino e investigação, é essencial e urgente, em particular face à complexidade técnica dos conceitos e soluções.
Ao nível do mercado, podemos referir por um lado, os apelos de consumidores preocupados com a saúde e o ambiente, mas também a demandarem alimentos a preços acessíveis, e por outro a teia de exigências impostas pela comercialização e a diversidade de sistemas de certificação, como a agricultura biológica e o GLOBALG.A.P., que certificam sistemas de produção, mais que também mascaram puras estratégias de marketing. E daqui resulta a confusão e a dificuldade de escolha de consumidores, mas também de decisores que devem construir políticas que a tudo isto respondam.
Dois pontos decorreram daqui.
Como primeiro ponto, a necessidade urgente de comunicar melhor o que pretendemos quando falamos de sistema alimentar, de sustentabilidade, de agroecologia, mas também de revalorizar e relembrar a importância deste setor que assegura, ainda hoje, os nossos alimentos e que, ao mesmo tempo, inclui verdadeiros guardiões dos ecossistemas.
Em segundo, foi unanime reconhecer que as decisões políticas devem estar assentes em evidências científicas, salvaguardar que todos os afetados devem ser ouvidos, em particular, neste caso, os agricultores que não podem ser os únicos a assumir os custos destas mudanças. A cada requisito adicionado, deve ser ponderada a compensação justa, que permita ao mesmo tempo assegurar os alimentos que queremos, seguros, a preços acessíveis e o bem estar social e económico dos agricultores.
Na sessão da tarde, olhámos o futuro. Reconhecemos a necessidade de ajustar políticas e medidas, com celeridade, às múltiplas questões e realidades que influenciam a proteção das culturas e o uso dos pesticidas. Mais uma vez, se deu relevo à necessidade de políticas assentes em evidência científica, que reflitam objetivos europeus e nacionais, mas que também assumam o papel da União Europeia e de cada país no mundo. Queremos assegurar a soberania alimentar, a segurança alimentar, o rendimento dos agricultores, o acesso ao mercado internacional. É tanto o que queremos.
Também foi lembrado que diferentes políticas têm diferentes resultados. Por exemplo, quando optámos por políticas que incentivam a qualidade através de sistemas de certificação de produtos ditos de qualidade, aceitámos perder a exigência do apoio técnico que decorria de uma política que visava a adoção de determinadas práticas ditas agroambientais e isso trouxe-nos ao dia de hoje, com diversos intervenientes a reclamaram a necessidade e urgência a de mais apoio técnico e extensão rural.
De manhã e de tarde, o tempo esteve presente. O nosso. Mas principalmente, o tempo necessário à ciência, à aprendizagem, ao desenvolvimento tecnológico e à capacitação profissional e técnica. Sejam as soluções biológicas, sejam as técnicas de estimativa do risco e os níveis económicos de ataque, sejam o recurso a recursos genéticos mais adequados..... o tempo é longo ou muito longo. Já o tempo do agricultor, que precisa de soluções hoje, ou o tempo do cidadão que demanda alimentos, saúde e ambiente de qualidade, é curto. Muito curto.
Em jeito de conclusão, emergem três ideias.
A ciência é coxa e tem muita responsabilidade. Mas a ciência tem trazido muito conhecimento, muitas vezes co-construído com agricultores, associações, técnicos. São muitos os estudos que demonstram as consequências do uso dos pesticidas e do modelo de simplificação agrícola que as políticas públicas continuam a apoiar, quer na saúde humana quer nos ecossistemas. Se os políticos não desenham as políticas com base nessa evidência, isso diz muito deles. Mas não da ciência.
A segunda ideia resulta do facto de que todos temos os mesmos direitos. O direito a viver e ser feliz. Não importa se no sul ou no norte do país ou da Europa, se pequenos ou grandes agricultores. O que importa é que as políticas compensem devida e justamente o papel de cada um.
Finalmente, cada um acredita no que lê e no que quer. E é legítimo e real acreditar que se deve ser exigente nas metas a que nos impomos. O nosso papel não é discutir se reduzimos 50, 60 ou até 100% dos pesticidas que usamos. O nosso papel, enquanto cientistas, professores, técnicos, agricultores ou políticos, é procurar o caminho para lá chegar. Se lá chegarmos, seremos todos, seguramente, mais felizes e saudáveis.
Por: Cristina Amaro da Costa
Escola Superior Agrária/Instituto Politécnico de Viseu
Organização
Comissão organizadora
Ana Cristina Ramos (INIAV/APH)
Ana Paula Nunes (COTHN-CC)
Cristina Amaro da Costa (ESAV, IPV)
Elisabete Figueiredo (ISA)
Helder Coelho (COTHN-CC)
Maria do Céu Godinho (ESAS, IPS)
Nélia Silva (Comunicland)
Raúl Rodrigues (ESAPL, CISAS/IPVC)
Rosa Guilherme (APH/CCDRC, IP)